CRÔNICA - Desconvencendo

Crônica publicada jornal AGORA fev/2009





















Ilustração Jairo Teixeira


E mais uma vez chegou o carnaval!

Embora o carnaval possa ser bem definido como ‘o estado de espírito brasileiro’, nesta época do ano ele se materializa em tambor e fantasias, ou a completa ausência delas, para felicidade dos mais assanhadinhos!
Quantos turistas chegam para o carnaval, arrastados por sua imensa curiosidade – muito mais sexual do que folclórica – pelas belas mulatas semi-nuas requebrando ao som do tamborim... E quem vai criticá-los? Suas mulheres? Ah, desculpe, mas neste momento elas estão ‘fora da área de cobertura ou ocupadas’ tentando descobrir se ‘aquilo tudo’ é enchimento! Lê-se por ‘aquilo tudo’ qualquer coisa que a sua mente fértil seja capaz de imaginar – afinal, estamos no carnaval!
E se você ainda não sabe, existe uma lei que obriga todo e qualquer brasileiro a ser um bom carnavalesco - não uma lei escrita de fato, mas uma convenção – Gostar de carnaval é praticamente um pré-requisito para ser considerado um ‘brasileiro que se preze’.
Assim como a convenção de que ‘gaúcho que é gaúcho’ toma chimarrão e assa (não basta comer) o ‘sagrado’ churrasquinho de domingo! Ah, e ao menos uma vez na vida é preciso ter montado em um cavalo!
Se você é vegetariano, tem nojo daquela ‘bomba de boca em boca’ e morre de medo de cavalo, ‘Bah, teu lugar não é aqui vivente! Por favor, te muda pra um outro estado - assinado tchê bagual’.
Assim como é de conhecimento geral que ‘homem de verdade’ bebe sua cervejinha assistindo ao futebol com os amigos e comentando a capa da última ‘playboy’, enquanto as mulheres (porque, afinal, mulher ‘sempre’ anda em comboio) lavam a louça do almoço, de olho nas crianças, falando mal de alguma coisa (serve o marido, a vizinha, ou a capa da playboy) enquanto assistem a novela, suspirando pelo protagonista bonitão!
Ah, as convenções – o preconceito enraizado, disfarçado de cultura popular! Deixemos a hipocrisia de lado - quem de nós não tem o seu preconceito? Seja com cor, peso, altura, música, sexualidade, naturalidade ou nacionalidade - ‘Argentino é isso ou aquilo’ – argentino é argentino e pronto!
Assim como o carnavalesco, o gaúcho, o homem ou a mulher – fora o rótulo, são pessoas, e para afirmar qualquer coisa além, é preciso conhecê-las, afinal, ‘de perto ninguém é igual’ – cada um de nós é uma ‘caixinha de surpresas’ - nem sempre o conteúdo agradará a todos, isso é fato! Fazer o quê? É o que somos e isso é valioso!
Deixemos o gaúcho ser vegetariano, deixemos o homem lavar a louça, deixemos a menina gostar de ‘playboy’, deixemos as pessoas serem felizes, cada um ao seu modo. A felicidade dos outros não incomoda ninguém! Ao menos não deveria incomoda - Diga isso ao seu vizinho, aquele do ‘desgosto musical’ com ‘problemas auditivos’ que todo domingo demonstra sua felicidade em decibéis...
Ao menos esta convenção deveria ser unânime: ‘sua liberdade termina onde começa a do próximo’... Alguém devia avisar ao seu vizinho!
Agora, se você é brasileiro e não gosta de carnaval, se irrita com batucada e tem alergia a plumas e paetês – paciência... Muitos esperam o ano todo por este momento, muitos vivem e trabalham por esta festa! Lembre-se: tudo que vem, vai – embora não ‘vai’ mais rápido só porque você quer! Aceite isso! E ao menos aproveite o feriado para fazer algo que não seja reclamar. Divirta-se! Mesmo que para isso seja necessário correr para bem longe, usando grandes tampões de ouvido! Boa sorte com o transito, pois parece que o mundo está vindo pra cá!
Aos demais, ‘brasileiros que se prezem’: Aproveite, afinal, tudo é festa! Já dizia o carnavalesco bêbado: ‘Tá chegando a hora... a hora é essa... que horas são?’
Vista a fantasia, só não vista as convenções!
E viva o Carnaval!

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