CRÔNICA - Esse tal de não sei

Imagem: Steve Adams
Sempre detestei esse tal de “não sei”. Coisa de quem não quer dizer, disfarçado num ar de mistério ou falta dele.

Mas afinal, o que é não saber?



Muitas coisas estão escondidas por trás de um não sei. Ele pode significa algo como:

— não quero expor minhas ideias
— não quero compartilhar o que eu penso ou sinto
— não confio o suficiente em você
— não me envolvo/não me importo
— você não está preparado para ouvir isso
— não posso dizer ou nem quero



Usar um “não sei” é, na maioria das vezes, negar algo bem sabido. Como uma máscara para as palavras, um escudo para os próprios sentimentos, um refúgio bem próximo. Um “Não perturbe!” na porta invisível que nos separa do restante do mundo.

Esse “não sei” confere ao interlocutor uma espécie de poder Nos meus pensamentos você não pode entrar ou demonstra insegurança, como o aluno que temendo a reposta errada, tasca logo Não sei.

Pode também representar uma gentileza, do namorado que prefere evitar a sinceridade diante de questões mais complexas, como: "Este vestido está bem? O que você acha desta cor de cabelo? Está gostoso?" Resposta: Não sei, não sei e não sei. Uma mentirinha saudável ou apenas auto-proteção?

Nota: “tanto faz” e “você é quem sabe” nada mais são que
variações do caso, ou seja: um “não sei” disfarçado.

A sinceridade (aliada a coragem de arcar com as consequências das palavras, quem dirá dos atos) é algo hoje tão raro quanto miss sem cirurgia plástica e a comparação é válida:
Todo mundo gostaria de ver, mas admira o efeito de um bom “embrulho”, pois sabe que a verdade “nua e crua” nem sempre é tão bela.

Pergunta: “Você esta feliz?” – Resposta: “Não sei”
Mas COMO alguém pode não saber se está feliz?
Também sempre me perguntei onde se come um “não sei”, que gosto ele tem, onde fica esse lugar e que “raios” de cor é essa?

Saiba, arrisque, erre, opine! Atitudes!
Não sei é o curinga do discurso mudo.

Comentários

Anônimo disse…
E a pessoa que recebe um "não sei" não pode, simplesmente, aceitar o fato de que o que diz "não sei" pode não querer expor suas ideias, ou não compartilhar o que pensa ou sente, ou não confie o suficiente no interlocutor, não queira se envolver, não se importe, pense que o interlocutor não está preparado para ouvir, não possa dizer ou, simplesmente, não queira dizer?

Às vezes, é muito mais simples, e até mais polido, sair pela tangente de uma pergunta capciosa, ou mesmo bem-intencionada cuja resposta pode ser constrangedora para uma das partes - ou ainda de um terceiro, o que caracteriza maledicência, a popular fofoca - fazendo o uso de um bem colocado "não sei".

Não é bem o meu caso. Eu sou, como se diz, "estômago-frio", e me meto em enrascadas. Se quem pergunta não está se importando em ficar constrangido, tampouco eu fico ao soltar uma resposta curta e grossa, certeira como coice de porco, mas sempre com três alternativas possíveis:

1) Digo exatamente o que penso;
2) Digo: "Isso é problema meu. Não é da tua conta, oras.";
3) Uso a cara de sarcástico que Deus me deu, e devolvo a pergunta:
"Tu quer MESMO que eu responda?"

Se me vem com a pergunta: "Você é feliz?" eu responderia "Não. Felicidade é uma utopia, para a qual não estamos preparados. Mas, da minha vida, não tenho do que me queixar."

Se o cidadão insiste em saber se minha vida é boa ou ruim, eu dou a segunda resposta: "Olha, você não tá sendo curioso demais, não? Isso é problema meu. Você não tem nada com isso".

E se a pessoa continua insistindo: "Por que você é tão amargo?" eu uso uma terceira opção: "Tu quer MESMO que eu responda?"

E terei acabado de perder um amigo. Ninguém mandou ser curioso, e não ter entendido que o meu "não sei" serve para manter curiosos do lado de fora.

É um poder que me reservo. Insegurança? Talvez. Mas isso é problema meu.
Tua escrita é fina, atinge como agulha, nos leva às manchas que borram a nossa vida e continuam...tentamos limpá-las , e a força é tanta pra isso e derramamos chuva onde arde.

Cintia Thome