Moda de bola murcha

Crônica publicada no Mulher Interativa do Jornal Agora // Ilustrada por Lorde Lobo

Gravidez e moda, não combinam. Ao menos não, segundo a opinião dos lojistas - basta visitar qualquer "casa de roupas" e nela, sua sessão de moda-grávida. Isso se houver uma, o que já seria alguma coisa. Na maioria das vezes, o que se encontra é um cabideiro ralo exibindo meia dúzia de peças ultrapassadas e de um senso estético tão duvidoso que faria da toalha de mesa da sua avó uma opção mais moderna.

Mas se você não está grávida, não precisa se preocupar com isso - a menos que seja mais alta que a maioria - porque se for mais baixa, é claro que já guarda na manga, ou na barra sobressalente, uma competente costureira especialista em bainhas - ou que esteja um tanto acima ou abaixo do peso de uma modelo padrão - o que é algo entre um manequim 36 e, no máximo, um 40 que na verdade é um 38 enrustido. Agora, se você está grávida, em processo de crescimento multidimensional progressivo, querida... Bem-vinda ao clube!

A primeira coisa que muda no guarda-roupas de uma grávida é o tamanho de sutiã - o que costuma ser motivo de alegria, fogos de artifício e lágrimas de emoção, tanto da portadora dos novos 'meninos' quanto, e especialmente, daquele que tem o privilégio de acompanhar de perto o crescimento deles - marido, namorado, vizinho voyer, tanto faz. Os primeiros dois aumentos de número são uma verdadeira conquista - até porque, nesse ponto, a barriga ainda não está muito grande e, dependendo da roupa, parece que se ganhou um belo par de silicones e uns quilinhos nos lugares certos - uma maravilha. Até que o primeiro top G aperta... E o 46 estranhamente não fecha! Momento este acompanhado pelo crescimento expansivo da barriga, das ancas, das bochechas, da fome e de tudo que leva uma mulher ao encantador estado de embolotamento - estado muito encantador esse, dizem eles.

Já você, por outro lado, depois de experimentar todas as coisas possíveis e descobrir serem elas, na verdade, incabíveis, começa a blasfemar contra a magia do momento... Magia que transforma cinderelas em abóboras recheadas. Mas, tudo bem, não se sinta culpada por conta disso - e, por favor, não use a comida como forma de soterrar a culpa. Blasfêmias, neuroses e mau-humor são absolutamente normais, adequados e extremamente comuns à mulher em "estado interessante" - ou seria "estressante" - ambos, simultaneamente, digo eu [e não estou aberta a questionamentos, ok?!!].

Pois bem, depois de organizar o guarda-roupas para a nova estação e descobrir que 60% das peças, em breve, não servirão, enquanto os outros 40% já não servem, não há lugar mais urgente a se ir, a não ser aquele no qual todas vão ao se sentirem acoadas - não, não é o salão de belezas, nem a barra da saia da mãe [de clichês já bastam as campanhas publicitárias] - falo de visitar as amigas mais traiçoeiras que se pode ter: as lojas, às compras!

É uma tremenda sacanagem aquilo que as lojas chamam de 'moda-grávida".
Parecem sugerir que, junto a forma, devam ser perdidos o senso de moda e a autoestima! Eis um testemunho indignado: horas depois de um completo desperdício de tempo, paciência e esperanças de adquirir roupas apropriadas ao meu estilo - grávida, ou não - como mulher prática e moderna que sou, penso em "atitudes plausíveis" a solucionar o dilema que me assombra:

1. instaurar o nudismo gestacional como moda-verão [e ser presa e/ou demitida por conta do pioneirismo mal-interpretado]; 
2. mudar de religião [embora antes seja preciso ter uma] e aderir à burca; 
3. fazer com a Beyoncé e criar minha própria grife [ah, "barbada", se você for uma diva pop ainda mais rica que grávida]; 
4. correr, balançando os bracinhos roliços, chorando e blasfemando contra a indústria têxtil, contra os ditadores da moda, contra os designos do universo e contra tudo mais que se intrometer no meu caminho até o procon, à geladeira, ao aconchego do meu lar, ou o que vier primeiro [mas ataque de piti tem limites, mesmo para uma bomba de progesterona ambulante].

No fim das contas, torna-se compreensível a aparente obsessão das gestantes por batas e leggings [argh!] - na falta de melhores opções, veste-se o uniforme da situação. É como o "pretinho básico" da gestação - não tem graça, mas... Não tem erro - e o melhor: cabe! Só o que não cabe é se deixar ser transformada em barriga, como se a mulher que ali está não passasse agora de uma mera incubadora. Já que o bebê é tudo o que importa, dane-se "o resto" que o cerca, o gera e o carrega. A barriga torna-se o foco - e, para muitos, uma propriedade pública: nunca se viu a dona dela antes, mas, pode-se passar a mão até que saia um gênio. Vale lembrar que aquela é a parte do corpo de alguém que anda sensível, instável e que merece um pouco de respeito, e não só da indústria da moda [mas dela, também, tenha dó!]

Comentários

Júlia Pereira disse…
gosto muito do que escreves!