Ao rugido que não quer calar

"Ela crescia. A cada dia mais e mais, em novas direções e maiores proporções. Crescia de forma rápida e eficiente, fazendo tudo ao seu redor parecer progressivamente menor  − em tamanho e significância. Ela crescia... E enquanto o fazia, se o silêncio adequado também fosse feito, podia-se ouvir a canção que seu corpo cantava a embalar o crescimento − uma melodia nada suave, composta pelo estalar de ossos, o estirar de músculos e o rasgar da pele. Ah, a pele... O maior de todos os órgãos era também o mais exigido, a cobrir toda ela, todos eles e resistir por ceder a tamanho crescer."
Crônica publicada no Mulher Interativa do Jornal Agora // Ilustrada por Lorde Lobo

Estrias não são tatuagens, nem qualquer outro tipo de ornamento a ser ostentado pela vaidade de quem o carrega. Pelo contrário, costumam ficar escondidas ou, quando acabam inevitavelmente reconhecidas, causar constrangimentos − menos da parte de quem vê do que de quem mostra. Trata-se de lesões decorrentes ou da distensão exagerada da pele − quando essa tem sua elasticidade testada e reprovada − ou de alterações hormonais que levam a degeneração das fibras elásticas, já não tão elásticas assim. Tais riscos longitudinais podem aparecer em diversas partes do corpo e variar de 1 a vários centímetros de extensão. Costumam surgir em função de um crescimento acelerado como o da puberdade e da gravidez.

E querendo e podendo, apesar de dificilmente reversíveis, trata-se, seja por laser, ácido, abrasão, peeling ou quaisquer outros métodos que devolvam o colágeno à pele, preencham as lacunas ou substituam o tecido velho por um novinho em folha. Vale dizer que a maioria desses métodos, além demorar a surtir efeito, custa caro, tanto em dinheiro quanto em sofrimento, mas, na era da popularização da cirurgia plástica e do photoshop, imperfeições são inadmissíveis! Quem as tem ou que as reverta ou que as esconda. Espera-se com isso que, em alguns anos, ninguém mais seja capaz de lembrar como se parecia um ser humano 'in natura', especialmente um do sexo feminino. 

Tentando reverter a imperfeição dessa linha de pensamento, o site americano (clique AQUI e conheça) "How To Be a Dad" (como ser um pai) criou uma ótima campanha:

"Tigers are beautiful" (tigres são bonitos),
"You are mother. We hear you roar"
(Você é mãe. Nós ouvimos seu rugido).
Traduzindo: Seu corpo não está arruinado.
 Você é uma baita tigresa que conquistou suas listras.
Créditos: howtobeadad.com

Ilustrada pela foto de um sexy abdome feminino (esse aí de cima) coberto por uma série de estrias, a campanha enfatiza aquela que é, ou deveria ser, a visão masculina sobre o assunto: "Seu corpo não está arruinado. Você é uma baita tigresa que conquistou suas listras". A mensagem é tão sensacional que transcrevo aqui, em tradução livre, a compilação de alguns trechos dela − e assino embaixo:

"Com um mundo guiado pela imagem e perfeição e inatingíveis padrões de beleza 'photoshopados', é desconfortável para nós imaginar tamanho sentimento de uma mulher por ter que se submeter ao "sacrifício" de "arruinar o seu corpo", a fim de ter um bebê. Estamos honrados em compartilhar essa mensagem de encorajamento apaixonado, em reconhecimento às mães e à beleza da maternidade. Com ou sem listras, as mães são tigres. E tigres são lindos."

Linda é a tal campanha, mas isso não significa que devamos jogar fora os dez mil cosméticos de cuidados com a pele, especialmente quando se tem a barriga em franco processo de expansão! A questão aqui é outra. Hipocrisias à parte: não é que alguém goste de ter estrias, mas uma vez que se adquira algumas − sobretudo em função da gravidez − fazer o quê?

Não é o fim do mundo carregar na pele as marcas de um momento que nos faz tão maiores, não apenas em tamanho. E digo isso enquanto escuto o ranger abafado de minha própria pele, sob camadas e camadas de hidratação. Abafa-se o ranger, mas nunca, o rugir:  

Nós, tigresas, somos fortes, somos mães, somos mulheres e nada ofusca a real beleza de uma!

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