Presentes

Crônica publica no caderno Mulher Interativa, jornal Agora - RS, em junho de 2012.

"As pessoas não compram livros de presente no Dia dos Namorados", constatou um amigo ao observar o movimento da livraria em que trabalha.

Apesar de lamentável, é uma constatação compreensível: sendo o dia dos namorados a mais intimista das datas, mais adequado seria um presente que não estimulasse o isolamento intelectual, roubando a atenção do 'bem' por horas a fio. Melhor seria um presente que pudesse ser usado a dois, como uma sugestiva cesta de café da manhã ou sua versão mais ousada, com vinhos e iguarias ou uma de intenções mais explícitas, como as que se compra nos Sex Shops da vida. Ou um presente que, ao ser usado, já estivesse afinando a sintonia de um para estar com o outro, feito um perfume, uma lingerie, um cd que começasse a tocar antes e continuasse durante, repetindo-se incessantemente ao embalar as horas da noite e de tudo o que vem depois.

Acontece que, por mais que pareça fácil encontrar o presente ideal para a data, não o é para o par - a tentativa de adivinhar e saciar o desejo alheio faz com que a escolha "do que dar" demore mais que o "dar" em si ou, melhor dizendo, que o dar... tudo de si, durante a comemoração da data. E num misto de dúvida, pressa e falta de romantismo, muitos acabam optando pela compra mais fácil - aquilo que ele pode não saber se quer, mas precisa ou aquilo que ele definitivamente não precisa, mas quer. E assim, algum gadget* modernoso, ostentoso e expensivo passa a ocupar o lugar dos tradicionais presentes de antigamente - algo, sem dúvida, super cool*. Pena que eles não caibam na caixa vermelha em formato de coração... vai na preta mesmo!






Claro que um "mpcoisa" daqueles que toca tudo e mais um pouco é um presente legal para quase qualquer pessoa em qualquer data, mas para manter a vida a dois num clima bacana, melhor seria algo que aproximasse o casal, um presente que não estimulasse o isolamento intelectual, roubando a atenção do 'bem' por horas a...



Opa, por que é mesmo que as pessoas não se dão livros nessa data? 









No dia dos namorados da era virtual, já não se compra livros, já não se manda flores, já não se dá bombons, já não se faz serenata como antigamente...
O mais perto que se chega disso é dedicar ao ser amado um clipe compartilhado numa rede social qualquer, para ser visto numa tela bem distante da janela da vida real.

Porém, na contramão do fim dos tempos, no mês dos namorados, uma senhora liga para uma rádio local pedindo para dedicar uma música ao seu amado no dia em que eles comemoravam 64 anos de casados... ele, com Alzheimer, não tomou conhecimento da homenagem, nem mesmo lembrou da data, mas ela... ela lembra, ela sempre lembra e comemora pelos dois, do jeito que se fazia antigamente e que fazia com que os casamentos durassem 64 dias dos namorados e outros tantos dias mais importantes que esse... 

...dias passados, muitos deles esquecidos, porém eternos por estarem, um para o outro, presentes.


Jandira e Boanergei: 64 anos de casamento!

Feliz dia dos namorados a todos leitores e, em especial, aos meus avós, Jandira e Boanergei Ruas, por mais um aniversário de casamento - ainda que eles não acessem a web e nem leiam textos tão grandes em letras tão pequenas.

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*Nota
Gadget - em inglês: geringonça, dispositivo.São comumente chamados de gadgets dispositivos eletrônicos portáteis como PDAs, celulares, smartphones, leitores de mp3, entre outros.
Cool - outro termo em inglês que significa, entre outras coisas, legal e frio.

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