Da vida pós-maternidade

by KATIE M. BERGGREN


Crônica publicada no Mulher Interativa do jornal Agora [RS] em Julho/2012

"A guerra de uma mulher se desenrola na cama de partos" 
- disse uma personagem do romance "Guerra dos Tronos - O Festim dos Corvos" (de G. Martin). 

Apesar de machista, a frase tem sua razão: na cama de partos o que ocorre é, sim, uma batalha. E apesar de não ser o único terreno onde as mulheres lutam, a luta que ali se trava é apenas o começo de uma guerra tão dura quanto e mais nobre que qualquer outra - a guerra da vida pós-maternidade. 

Dentro dessa guerra, tem a batalha do dia-a-dia, onde tempo é sono e sono é luxo. Só quem dorme muito é o bebê, mas em intervalos tão curtos que nunca se consegue acompanhar. E em cada pequena dormida dele abre-se uma grande oportunidade para fazer tudo aquilo que se deixa para depois:

"Uhu, o bebê dormiu! - uma vez vencida a batalha que pode ser fazer o bebê dormir - Vou terminar as unhas que comecei a fazer há três dias, depois, tomar um banho - que é pra tirar esse cheiro de leite azedo. Depois, dar uma arrumada no quarto e abrir um vinho e fazer um jantar especial e vestir algo especial para curtir o fim de noite com o bem, e depois... Xi, danou-se: o bebê acordou!" 
E assim, em pouco tempo o romantismo dá lugar a pressa e o plano fica bem, bem mais breve - batalha vencida! Tem ainda a luta silenciosa que se trava perante o espelho: 
"onde estou, quem sou, socorro, onde está meu pente e por que, diabos, ainda uso roupas de grávida, apesar do bebê ter sido bem parido há meses?" - feliz daquela que nunca saiu com a camisa manchada de vômito de bebê ou, melhor, nunca foi surpreendida por aquele peito que esqueceu de guardar horas depois de amamentar. 

Mas, segundo o ditado, "ser mãe é padecer no paraíso". Eu, nada sei sobre paraísos, nunca acreditei na existência deles e, particularmente, não recebi nenhum passe livre para algum, carimbado em qualquer parte do meu bebê - e olha que eu as vistorio com frequência na vigilância contra as perebas bestas que teimam em fazer dos bebês seu próprio paraíso. Tornar-se mãe é padecer, sim, mas em ambientes mais hostis, como o perigoso mundo das pracinhas, dos microorganismos e de todo mal que não se pode evitar, as ciladas das festas de aniversário e da sala de espera do consultório médico - que é para onde todas as ameaças em forma de perebas apontam.

Impressionante a quantidade de remédios que um bebê saudável precisa para se manter assim! 
Para cada pereba, uma consulta, para cada consulta, uma receita, para cada receita uma nova forma de perturbar o bebê para o seu próprio bem - são tantas as pomadas que dá vontade de misturar todas numa meleca só e besuntar a criança inteira! E assim, nos primeiros meses de vida, o pediatra acaba sendo mais visitado que qualquer parente. 

Talvez quem tenha a sorte de frequentar um mesmo pediatra por toda a infância do filho possa se considerar a alguns passos do tal paraíso onde as mães padecem - encontrar o pediatra ideal é, sem dúvidas um dos maiores desafios da vida pós-maternidade - mais difícil que acertar o aleitamento, a fralda, os horários de todas as coisas que entram em parafuso quando se tem um bebê em casa. É preciso que ele* tenha boas referências [*o médico, não o bebê, este pode ser inexperiente mesmo] e vaga na agenda e que atenda pelo plano de saúde da família e, se não for pedir demais, que seja bom tanto no tratar dos pequenos, quanto no trato com os pequenos e com as pessoas grandes que o acompanham. E, se possível, que não trate a mãe por "mãezinha" - o que reduz consideravelmente a lista de opções - tudo bem, a "mãezinha" sobrevive se ele for bom para o bebê.

E uma vez que se marque as benditas consultas, chegar nelas a tempo é outro desafio - mesmo sabendo que raramente o paciente será chamado na hora marcada, o que é outro problema. Nessa guerra que é a vida pós-maternidade, um bebê é uma bomba prestes a explodir - passadas duas ou três horas e é preciso começar tudo de novo: mamadas, arrotadas, trocadas... A vida gira em círculos menores quando se tem um bebê pequeno. Longas esperas, seja numa fila, num lindo consultório ou mesmo na sala de casa, podem parecer eternas - justo quando mais se precisa ser paciente.  

É preciso ser paciente, uma boa paciente e uma boa mãe, e como esta, para encontrar um bom médico a quem confiar aquilo que mais se preza, é preciso seguir os próprios instintos. Essa mãe-autora, por exemplo, esteve decidida a mudar o filho de pediatra, até que, numa consulta em que ele chorava muito, a doutora começou a conversar com ele. Ele riu... e a mãe simplesmente mudou de ideia, na mesma na hora - para se arrepender logo depois. Moral da história: 

1. Nunca deixe uma criança de três meses decidir o que é melhor para ela!
2. O sorriso de um bebê confunde até a mais racional das criaturas.
3. Mãe de primeira viagem só aprende tomando na cabeça. 

Portanto, nessa guerra da vida pós-maternidade, não use capacete. Vale mais ser vitorioso carregando cicatrizes dos danos tomados que sair ileso e derrotado.

Comentários

Lisa disse…
Tenho em casa um pequeno (e lindo!) bebê de 7 meses e meio e concordamos com tudo o que escreves!

Eventualmente e sem que ele saiba, espero que ele durma para dar uma espiadinha no teu blog. Obviamente, como bem colocasses, essa espiadinha nunca dura muito!
:)