um poema para uma poeta morta


créditos: reprodução
Conheci uma mulher
nova
também
poeta
cronista, escritora
também mulher
que vivia
onde eu vivo hoje
mas acabo de conhecê-la
e ela está morta

embora seu perfil, sua coluna
seus sites e os insights neles
não:
a morte virtual deveria fazer
parte dos ritos funerários.

tive com a morte
uma intimidade
semelhante àquela
que ela expressava
quando viva
e ninguém lia
ninguém
lia...
ou parecia se importar
com isso
prefiro acreditar que
ninguém lia

nem mesmo sua biografia
tão cheia de prêmios e
os planos esquecidos
no canto de um lugar comum
de escritos que eu ainda frequento
e me assombro
com um fantasma dela
preso eternamente ali.

e eu li
eu poderia ter lido antes, confesso
mão não teria feito
qualquer diferença.
pois eu li e
não não gostei
simplesmente
não gostei da poesia dela
e não vou dizer que gosto
pelo 'simples fato' dela estar morta.
ainda
que pudesse
ser eu ali.
mas não sou.

há algumas desvantagens em estar morto
uma delas é perder
[além da vida]
o direito a opinião
e em alguns casos
opinar parece mais importante
que estar
vivo.

pelo pouco que li
imagino que ela fosse
entender tamanha grosseria minha
disfarçada de sinceridade
patética
de [falta de] afinidade poética

a verdade
do que se pensa sobre
a obra
da vida de um poeta
jamais deveria ser dita
a menos que ela fosse boa
mesmo
se ele já estiver morto
- ou especialmente
nessas condições
por respeito

e o respeito muitas vezes
parece ser mais importante que
uma opinião sincera.
e é.

descubro com isso
que não posso partir tão cedo
pelo simples fato de não ter
ainda escrito
poemas premiados
poemas aclamados
poemas muito melhores
que esse
poema simplesmente
melhores

que os meus.


- Publicado originalmente em: www.revistasamizdat.com

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